terça-feira, 13 de janeiro de 2009

Secretário do PCdoB defende condenação do Brasil a Israel

Atuante na luta antiimperialista, pela soberania e direitos dos povos, o PCdoB tem incentivado seus militantes a integrarem as manifestações que acontecem por todo o país contra o genocídio na Faixa de Gaza. Um dos principais momentos de mobilização ocorrerá na abertura do Fórum Social Mundial, dia 27, em Belém. Em entrevista ao Vermelho, o secretário de Relações Internacionais do partido, José Reinaldo Carvalho, analisa a situação e defende a condenação enérgica pelo governo brasileiro às ações de Israel e o apoio à causa palestina.

Qual seria a saída para o fim dos conflitos entre Israel e Palestina?

A saída é muito difícil porque as razões que levaram a essa nova escalada são históricas e a situação é complexa. Só vejo solução se os problemas históricos e de fundo forem enfrentados. De qualquer maneira, é preciso lutar de imediato pela suspensão dos bombardeios, da ocupação terrestre e contra o cerco à Faixa de Gaza, assim como contra a campanha de aniquilamento da Resistência. É preciso também acabar com essa hipocrisia de dizer que as partes que estão negociando vão promover uma trégua e que o pressuposto é que o Hamas “pare de dar tiros”, como se se tratasse de uma guerra entre dois exércitos. O que há ali é massacre e uma luta desigual. Israel não pode continuar impunemente submetendo a população palestina e as forças da Resistência a uma operação de cerco e extermínio.

Porém, os problemas na região remontam à criação do Estado de Israel...

O Estado de Israel foi criado na base da usurpação do território da Palestina. Quando a Assembléia Geral das Nações Unidas de 28 de novembro de 1947 determinou, através da Resolução 181 a criação do Estado de Israel, estabeleceu também a criação do Estado da Palestina. Havia, então, a expectativa de que ambos os estados seriam capazes de conviver em harmonia. O que aconteceu, no entanto, é que desde então Israel foi se expandindo cada vez mais e inviabilizou a criação do Estado palestino. Não há o que tergiversar sobre isso. E mais: houve a guerra de 1967, quando Israel ocupou ainda mais territórios palestinos e árabes, revelando-se um Estado expansionista na região do Oriente Médio. Além disso, todo o processo de colonização dos territórios que passaram a ser de Israel foi feito na base da usurpação de terras das famílias palestinas, o que gerou um grande êxodo. Existem cerca de 4 milhões de refugiados. Por tudo isso, além da questão imediata deste conflito, é preciso avançar para a criação do Estado da Palestina livre, independente, com plena soberania, tendo por capital Jerusalém Oriental. Enquanto estas questões não forem resolvidas, não haverá paz na Palestina.

E os Estados Unidos têm papel fundamental no acirramento dos conflitos...

Sim. A resolução 242 da ONU, posterior ao conflito de 1967, determina a devolução de todos os territórios ocupados então e a criação do Estado Nacional Palestino. Então, quem está violando o direito internacional é Israel e os protetores de Israel, ou seja, os países imperialistas, especialmente os Estados Unidos, mas também a União Européia. A situação se complica com a tentativa dos Estados Unidos de impor o chamado Plano de Reestruturação do Oriente Médio, um engendro da Administração Bush, que corresponde às ambições hegemônicas do imperialismo norte-americano. Israel é a cabeça de ponte para a realização desse plano; é um Estado artificial que existe em nome dos interesses do imperialismo. É por isso que Israel guerreia não só contra os palestinos, mas também contra o Líbano, contra a Síria e outros países da região. E é por isso que urde planos para agredir o Irã. E, claro, desta estratégia faz parte também o apoio dos EUA a regimes árabes reacionários, que se comportam como “cavalos de Tróia” dentro do mundo árabe.

Que peso tem a vitória obtida pelo Hamas nas eleições parlamentares de 2006 nos conflitos atuais?

É curioso. Os países imperialistas aparecem como paladinos da democracia, exigiram eleições na Palestina e chegaram a monitorá-las. O Hamas se apresentou como força política, aceitou jogar as regras eleitorais e foi o vencedor daquelas eleições por conta de sua força política. Porém, esses mesmos países que supostamente defendem a democracia não reconheceram a vontade do povo palestino. Ou seja, para eles as regras democráticas só valem se uma determinada força ganha a eleição. A não aceitação dos resultados eleitorais e o anúncio do bloqueio dos fundos da Palestina feitos por Israel, Estados Unidos e União Européia certamente contribuíram para deteriorar a situação, que culminou com o sítio a Gaza, inviabilizando o suprimento do território em gêneros de primeira necessidade e medicamentos. O problema, portanto, não está no fato de ser o Hamas, islâmico e xiita. O problema é que Israel, os EUA e a UE não aceitam a emergência de forças da Resistência nacional. O mesmo acontece no Líbano com o Hezbollah.

Como se deu o fortalecimento de organizações com o Hamas e o Hezbollah?

Houve um momento importante na luta dos povos árabes durante as décadas de 1950, 1960 e 1970, quando emergiu o nacionalismo pan-árabe, formado por importantes forças republicanas, laicas, patrióticas, que chegaram ao poder em vários países árabes como fruto de revoluções nacionais, democráticas e anti-monárquicas. Uma das grandes figuras desse período foi o presidente (Gamal Abdel) Nasser, no Egito. Essas forças entraram em decadência por razões variadas e isso levou à emergência do que se chama de fundamentalismo islâmico. Tanto o Hamas quanto o Hezbollah crescem no vácuo deixado pelo enfraquecimento dessas forças e, claro, pelos seus méritos próprios como forças políticas capazes de se ligarem ao seu povo e de defender a identidade nacional, levando esta luta às últimas conseqüências. Existe, claro, um componente religioso, que é habilmente explorado pelo inimigo para semear a divisão das forças patrióticas e da Resistência nacional. Nós, comunistas, não concordamos com a idéia de um Estado teocrático, mas reconhecemos nessas organizações forças ligadas ao povo e cuja atuação tem sentido antiimperialista.

No conflito atual, como analisa a atuação dos principais países do tabuleiro político internacional, especialmente Estados Unidos e França?

O imperialismo norte-americano demonstrou, mais uma vez, seu apoio indeclinável a Israel. Bloqueiam qualquer possibilidade de o Conselho de Segurança da ONU tomar medidas efetivas em favor do cessar-fogo. A última Resolução foi um pedido de cessar-fogo, com a abstenção dos EUA. Esta potência imperialista propagandeia – com o apoio da mídia pressurosa em difundir esta idéia – que Israel está se defendendo do Hamas. Isso é falso. Tentam transformar o agressor em vítima. O imperialismo atua no sentido de legitimar os ataques e o genocídio e corrobora a estratégia israelense de aniquilar a Resistência palestina. A União Européia age no mesmo sentido. Os presidentes da França e da República Tcheca (esta última no exercício da presidência da UE), por exemplo, declararam seu apoio a Israel na luta contra o Hamas. Por isso o Hamas repudiou a intervenção da UE e em particular da França classificando-a como parcial, por tomar o lado de Israel. O presidente Nicolas Sarkozy envergonhou a França com o comportamento de trapalhão durante a semana passada trombeteando ter patrocinado um acordo de paz, sendo imediatamente desmentido por todas as partes envolvidas. Diga-se entre parênteses que poucas semanas antes ele veio ao Brasil desfrutar das demonstrações de sabujice de setores das classes dominantes brasileiras e da mídia que o paparicaram e fizeram com que se sentisse um imperador. Veio tentar atrair o Brasil e o Mercosul para a área de influência da União Européia. No que se refere ao Oriente Médio a UE pretende ocupar uma posição de destaque na crise. O plano apresentado por França e Egito é inócuo porque nem de longe faz menção clara à questão principal já referida aqui: criar um Estado palestino livre, independente e autônomo. Por fim, fazem parte das metas da União Européia a criminalização do Hamas e do conjunto da Resistência palestina.

E a postura do governo brasileiro?

Entre as forças políticas que integram o governo brasileiro, o PCdoB é uma das que mais valorizam a política que o presidente Lula e sua chancelaria têm feito em relação ao Oriente Médio. O ponto alto foi a realização da Cúpula América do Sul e Países Árabes, que atraiu a hostilidade dos EUA e de Israel. Foi muito positiva a declaração espontânea do presidente Lula quando condenou os EUA por impedirem uma ação da ONU em favor do cessar-fogo na crise atual. Corajosamente, criticou a própria ONU. Mas, me permito dizer que a posição formal do Itamaraty apenas “deplorando” a agressão israelense por ser “desproporcional” é uma posição tíbia, digamos, tecnicista, protocolar. É preciso condenar os ataques. A clareza política não pode ser obnubilada pelos rituais diplomáticos. O Brasil deve jogar um papel mais afirmativo em favor da causa palestina e condenar o terrorismo israelense. O presidente Lula deveria, inclusive, rever a decisão de visitar Israel este ano. Além disso, o Brasil não pode permitir que se concretize a proposta de realizar um acordo bilateral entre o Mercosul e Israel. Nossa diplomacia, que com muito talento desmontou a Alca, deveria ajudar a desmontar essa proposta. Aproveito para aplaudir a atitude do presidente Hugo Chávez de romper relações com Israel. O Estado terrorista e genocida de Israel merece ser repudiado e sancionado pela comunidade internacional.

Que papel o PCdoB pode desempenhar neste momento?

O PCdoB luta pela paz e apoia os esforços pela paz e, de imediato, para que cesse o genocídio e a crise humanitária em Gaza. Mas, é preciso que se apresentem planos sérios, factíveis. Será inócuo qualquer plano de paz que não parta de uma condenação clara à ofensiva israelense, de uma caracterização clara de que Israel está fazendo um genocídio e de uma exigência impositiva de que acabem imediatamente com os bombardeios e a ocupação em Gaza. Estamos orientando nossa militância a realizar manifestações em todo o Brasil, fortalecendo as organizações que lutam pela paz e praticam a solidariedade internacionalista, participando dos protestos e contribuindo para fortalecer a unidade do movimento pela paz. Estamos principalmente conclamando nossa militância, quadros e organizações sob nossa influência a transformarem o ato público de abertura do Fórum Social Mundial em Belém, dia 27, num grande ato contra o genocídio perpetrado por Israel nos territórios palestinos. O partido estará lá cumprindo seu papel de força internacionalista e solidária.


De São Paulo,
Priscila Lobregatte

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