Por Eduardo Caetano,
RTP actualizado às 14:26 - 31 Maio '10
Pelo menos dezanove pessoas morreram e outras trinta e seis ficaram feridas na sequência do ataque de comandos israelitas à "Frota da Liberdade" que transportava cerca de 10 toneladas de ajuda humanitária e algumas centenas de militantes pró-palestinianos. O ataque deu-se em plenas águas internacionais. O Primeiro-Ministro israelita, Benjamin Netanyahu, decidiu manter a sua viagem oficial ao Canadá e aos Estados Unidos apesar do ataque.
Um conjunto de barcos liderados por um navio de nacionalidade turca dirigia-se para a Faixa de Gaza com ajuda humanitária e algumas centenas de pessoas que procuravam furar o bloqueio imposto por Israel àquela região do Médio Oriente. Aparelharam no domingo pelo meio-dia levando a bordo vários deputados do Parlamento Europeu que viajavam a título individual.
Detectados pela defesa israelita, três navios lança-mísseis da classe Saar saíram pelas 21h00 locais (18h00 TMG) do porto de Haifa e dirigiram-se à frota internacional com a missão de a interceptar e impedir a sua aproximação de território palestiniano. Era já madrugada quando esta segunda feira os três navios de guerra avistaram a frota auto-denominada "Frota da Liberdade". "O comando agiu em alto mar entre as 04h30 e as 05h00 da manhã (01h30 e 02h00 GMT) a uma distância de 70/80 milhas (130 a 150 quilómetros) das nossas costas", informa o porta-voz das Forças Armadas israelitas. Encontravam-se em plenas águas internacionais. Foi aí que as autoridades militares decidiram agir. Helicópteros israelitas transportaram os comandos que desceram por cordas à abordagem do navio turco Mavi Marmara, que comandava o comboio alegadamente humanitário.
Um canal de televisão do movimento islamista Hamas, que governa a Faixa de Gaxa, mostrava esta segunda-feira imagens de comandos israelitas a descer por cordas de helicópteros para os navios da frota de ajuda humanitária e a desencadearem confrontos armados com os passageiros pró-palestinianos já a bordo do barco turco que liderava o comboio. Vários feridos aparecem também claramente nas imagens telefundidas. Dez mortos e dezenas de feridos de acordo com as autoridades militares israelitas, 15 abatidos e meia centena de feridos a acreditar nomeadamente na ONG Turca a operar em Gaza IHH.
"Quinze pessoas foram mortas durante o ataque, sendo a maior parte delas de nacionalidade turca", afirmou Mohammed Kaya que dirige a ONG em Gaza. As Forças Armadas israelitas, que impuseram o silêncio nas informações sobre a sua acção militar, sempre foram adiantando a sua versão dos acontecimentos. De acordo com o canal de televisão israelita, os comandos israelitas abriram fogo após terem sido atacados com machados e facas por membros que seguiam a bordo da flotilha. "Durante a operação, soldados israelitas foram confrontados com duras violências físicas. Alguns dos passageiros utilizaram armas brancas ou machados e tentaram arrancar as armas das mãos de um dos soldados. Face à necessidade de defender a vida os soldados empregaram meios anti-motim e abriram fogo", lia-se no comunicado das Forças Armadas.
"Esses confrontos fizeram vários mortos e feridos entre os passageiros. Pelo menos quatro soldados foram feridos, um dos quais com um tiro e foram transferidos para hospitais israelitas", acrescentava o comunicado. Pelo menos um dos navios ficou apreendido pela marinha israelita.
Versão Israelita
Israel acusa os passageiros do barco turco, pró-palestinianos, dos incidentes ocorridos na madrugada desta segunda-feira.
De acordo com Mark Regev, o porta-voz do Primeiro-Ministro Benjamim Netanyahu, foram os passageiros do barco de ajuda humanitária que desencadearam os confrontos. "Nós fizemos todos os esforços possíveis para evitar este incidente. Os militares tinham recebido instruções segundo as quais se tratava de uma operação de polícia e um máximo de retenção deveria ser usado", acrescentou Regev citado pela France Press. "Infelizmente, eles foram atacados com uma extrema violência pelas pessoas do barco, com barras de ferro, facas e com tiros reais, sublinhou Mark Regev. Ficou por explicar na versão israelita porque é que a acção foi levada a cabo em águas internacionais sobre as quais a marinha israelita não tem quaisquer direitos e em consequência disso em clara violação do direito internacional.
O apelo aos protestos árabesEm Gaza, o Hamas, movimento islamista que controla o território, apelou a um levantamento árabe e dos muçulmanos frente às embaixadas israelitas.
"Apelamos a todos os árabes e a todos os muçulmanos que protestem frente às embaixadas sionistas em todo o mundo", declarava o porta-voz do Hamas, Sami Abou Zouhri.
O chefe do governo do Hamas em Gaza, Ismail Haniyeh denunciou "o ataque bárbaro" contra a flotilha internacional.
A Autoridade Palestiniana reclamou a convocação de uma reunião do Conselho de Segurança das Nações Unidas para analisar o acto. O Presidente Mahmoud Abbas condenou o "massacre" e decretou três dias de luto nos territórios palestinianos. "Consideramos que se trata de um massacre que nós condenamos", afirma Mahmoud Abbas.
O Egipto pleiteou o seu protesto contra a acção israelita com o porta-voz do ministro dos Negócios estrangeiros, Hossam Zaki, a "condenar as mortes perpretadas pelo exército israelita a bordo de um barco da flotilha que se dirigia a Gaza para furar o bloqueio israelita".
"O Egipto sempre chamou a atenção para o perigo do bloqueio ilegitimo imposto à Faixa de Gaza" e "apela novamente após estes trágicos incidentesao levantamento imediato" do bloqueio, concluiu.
Condenação internacionalA acção militar empreendida por Israel contra a missão alegadamente humanitária pró-palestiniana já foi condenada internacionalmente. O chefe da Liga Árabe Amr Moussa, já veio afirmar peremptoriamente que "nós condenamos este crime, cometido contra uma missão humanitária e contra civis. Nós tentamos ajudar as pessoas. Esta não era uma missão militar, toda a gente deveria condenar esta acção."
"Estamos em contacto com os países árabes para decidir a próxima etapa", concluiu Amr Moussa.
No Ocidente, a União Europeia já pediu a abertura de um "rigoroso inquérito" pelas autoridades israelitas sobre as circunstâncias do seu raide contra a frota de ajuda pró-palestiniana.
Os embaixadores dos 27 países da União Europeia em Bruxelas reúnem-se extraordinariamente no início da tarde de hoje para fazer o ponto da situação após o assalto do exército israelita à flotilha pró-palestiniana que se dirigia a Gaza. A Grécia já chamou o embaixador israelita em Atenas para saber da situação dos seus cidadãos e interrompeu o exercício militar conjunto a que que levava a cabo com a marinha israelita.
A França pela voz do seu Presidente, Nicolas Sarkozy , "condenou" o "uso desproporcionado da força" exigindo "toda a luz sobre esta tragédia" que demonstra a necessidade do relançamento do processo de paz.
O comunicado do Eliseu refere que o "Presidente da República exprime a sua profunda emoção face às trágicas consequências da operação militar israelita contra a 'Flotilha da Paz' com destino a Gaza".
Desproporcionado foi também a qualificação do governo alemão. A intervenção mortífera israelita contra a flotilha pró-palestiniana ao largo de Gaza "é à primeira vista desproporcionada" segundo afirma o porta-voz do executivo de Angela Merkel, Ulrich Wilhelm.
"Os governos alemães sempre reconheceram o direito de Israel de se defender mas esse direito deve ser exercido no quadro de uma resposta proporcional" acrescenta concluindo que "à primeira vista parece que esse não é o caso".
O ministro irlandês dos Negócios Estrangeiros, Micheal Martin, denunciou a acção "totalmente inaceitável" de Israel.
"Estou seriamente preocupado com o assalto a um navio turco esta manhã por comandos israelitas", declarou o responsável político irlandês. "O meu ministério procura estabelecer os factos e assegurar-se da segurança dos oito irlandeses que estavam a bordo", continuou.
"As informações segundo as quais 15 pessoas teriam morrido e 50 ficado feridas, se forem confirmadas, contituiriam uma resposta totalmente inaceitável do exército israelita contra o que era uma missão humanitária que tentava entregar bens absolutamente necessários aos habitantes de Gaza", acrescentou. A Noruega junta a sua à voz dos outros países que condenam a acção israelita qualificando-a de "inaceitável" e reclamando um inquérito internaconal segundo declarou o seu primeiro-ministro, Jens Stoltenberg.
A Noruega chamou também o embaixador israelita em Oslo. "Quaisquer que sejam as circunstâncias, é inaceitável lançar um assalto militar contra militantes humanitários civis", afirmou.
"O governo norueguês possui informações segundo as quais o exército israelita assaltou barcos que transportavam ajuda humanitária civil", concluiu.
O Governo português "condena" o assalto israelita e apela à instauração "rápida" de um inquérito "imparcial.
"O governo portuguêslamenta profundamente a perda de vidas humanas, condena o uso excessivo da força contra alvos civis e apela à instauração rápida de um inquérito para definir de forma imparcial as responsabilidades", lê-se num comunicado do Ministério dos Negócios Estrangeiros.
"O governo português reitera a sua profunda preocupação com a situação humanitária em Gaza e apela à aplicação total da resokução 1860 do Conselho de Segurança e ao respeito pelos direitos humanitário internacional" acrescenta a nota do ministério de Luís Amado.
O Alto Comissário da ONU para os Direitos do Homem, Navi Pillay, afirmou-se "chocado" pelo assalto à flotilha pró-palestiniana.
"Estou chocado com as informações que indicam que uma missão humanitária foi atacada esta madrugada e que causou mortes e feridos quando a frota se aproximava da costa de Gaza", declarou Navi Pillay.
O Secretário-Geral da Organização das Nações Unidas, Ban Ki-moon, revelou-se "chocado" em Kampala com o assalto dos comandos israelitas.
"Injustificável" e "inaceitável" são qualificativos que se lêem em quase todas as notas dos governos europeus sobre o incidente da madrugada desta segunda-feira. Relações agravam-se entre a Turquia e IsraelA Turquia convocou o embaixador israelita em Ankara. "O Embaixador (Gabby Levy) foi chamado ao Ministério dos Negócios Estrangeiros. Nós vamos transmitir-lhe a nossa reacção em termos muito firmes", declarou um diplomata turco que pediu o anonimato.
O vice-primeiro-ministro, Bulent Arinc, manteve entretanto, uma reunião de urgência com os mais altos responsáveis, entre os quais o ministro do Interior, o Chefe da Marinha e o Chefe das Operações Militare de acordo com a agência Anatólia. As relações entre a Turquia e Israel, que já não se encontravam num nível ideal poderão agravar-se substancialmente e mesmo piorarem irreversivelmente. O incidente "poderá trazer consequências irreparáveis nas nossas relações bilaterais", avisa Ankara que chamou o seu embaixador em Israel à capital.
Em Istambul e Ankara, concentraram-se muitas centenas de pessoas frente às instalações diplomáticas israelitas para protestar contra o ataque à "Frota da Liberdade". Em Istambul, meio milhar de manifestantes protestaram energicamente entoando slogans hóstis a Israel. Importantes forças policiais foram deslocadas para o local evitando que a situação saísse de controlo. Não impediram no entanto, o lançamento da garrafas de plástico contra o edifício.
Na capital, cerca de 200 pessoas manifestaram-se frente à residência do embaixador de Israel. Promoveram uma oração pública.
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