Comentário do Blog: O texto abaixo é mais que um desabafo de um haitiano, ele expressa o sentimento de todo o povo do Haiti com relação ao papel deplorável de gendarme do imperialismo norteamericano e francês que o governo brasileiro cumpre a risca. Sem dúvida, o povo brasileiro, através de suas organizações sociais e partidos políticos precisa tomar para si as dores desse povo irmão e fortalecer a solidariedade com sua rebeldia histórica, com sua luta contra a ocupação do seu país pelo exército brasileiro , pela sua autodeterminação.
Os haitianos estão se organizando e deram um ultimato aos cascos azuis: FORA DO HAITI !
Antes da chegada ao Haiti da Missão de Estabilização das Nações
Unidas (MINUSTAH, por sua sigla em Inglês), quando se falava do Brasil, a
referencia era o futebol, o rei Pelé ou o Carnaval no Rio, que constitui uma
maravilha artística e cultura. Isso
é tão certo que, em sua busca para ganhar os corações e mentes dos haitianos,
em 18 de agosto de 2004, o governo usou a seleção brasileira de futebol para
jogar uma partida de futebol chamada "Pela Paz" contra a seleção do
Haiti. Aquele dia foi um tormento
para os jogadores haitianos que viram os nossos patriotas aplaudirem os
jogadores brasileiros em detrimento de sua própria seleção. E, para castigar ainda mais o país, os
jogadores e dirigentes brasileiros foram se hospedar no país vizinho, após o
jogo, o que significava que o Haiti não era digno de honrar a hospitalidade às
estrelas brasileiras.
Não importa! Hoje,
além de futebol e da cultura brasileira, há também os massacres de pessoas
pobres, cólera e a arrogância natural de um exército ocupante na relação com os
subjugados. Todavia, de uma
perspectiva geopolítica e estratégica, a realidade brasileira é radicalmente
diferente e está guiada pelo compromisso de estender sua influência sobre os
demais países da região.
A maneira mais
simples de definir o imperialismo é: "Aquele que procura estender sua
autoridade sobre os outros", especialmente, aos pequenos. A presença militar no Haiti marca o
Brasil entrando em uma fase imprudente em que é indispensável causar vítimas
para proteger seu status de potência regional. O Brasil tem a hegemonia e o controle
de 40% da economia sul-americana. Portanto,
essa é uma transformação lógica. Tanto
os impérios como os seus sistemas nasceram "entre o sangue e suor". A dominação não tem coração, ainda que
alguns dominadores sejam mais ferozes do que outros, mas todos se baseiam na
necessidade imperialista de submeter para o exercício da pilhagem das riquezas
dos outros, a fim de beneficiar suas classes dominantes, sejam castas ou
tribos. Neste contexto do século
XXI, em que a complexidade do mundo ampliado torna mais difícil controlar o
jogo das alianças, é mais trágico do que nunca. No mundo de muitas convulsões, com
muitos incendios para apagar, muitos povos se insurgindo... Outros parceiros,
certamente menos poderosos, mas capazes de dominar conflitos de baixa
intensidade, são importantes para salvaguardar os interesses dos países mais
poderosos. Assim se apresentou o
Brasil.
Não é por acaso
que os Estados Unidos e a França optaram pelo Brasil. Conhecem as ambições imperialistas,
de segundo amo do hemisfério, desde a esfera do econômico até sua obsessão
declarada de ser parte do Conselho de Segurança da ONU e, também, reconhecem a
larga experiência, adquirida nos anos da ditadura, com a repressão e
assassinatos, um elemento essencial do cartão de visita internacional do
Brasil. Sem negligenciar, no
entanto, os interesses dos ricos deste país em expandir sua produção e cultivo
para toda a região. Quando esses
dois conquistadores solicitaram seus serviços, estavam certos de que o
presidente Lula da Silva não resistiria a esta proposta. Para isso, sacrificou
os vínculos e convicções ideológicas e preencheu o seu cartão de conquista. Assim, americanos canadenses e franceses
chegaram ao país das favelas pela mão do "tutor aluno", afinal estão
muito ocupados lidando com outras crises criadas no mundo.
A missão de Lula é
"estabilizar" o Haiti. Em
termos não diplomáticos, o Brasil deve desempenhar um papel de polícia. Os reveses sofridos pelos EUA na Somália, em 1994 e 1995, e o impasse no
Iraque e no Afeganistão e, mais recentemente, a invasão da Líbia e a tentativa na Síria são algumas das
frentes abertas onde o imperialismo está metido, o que o impede de se aventurar
com outro problema, cujo confronto os
colocaria face a face com os negros do Haiti. Lula da Silva abusou dos laços
culturais entre os dois países, Haiti e Brasil, para implementar a política de
conquista.
Atenção, haitianos progressistas!
Alguns
progressistas haitianos se deixam enganar pela lógica das proximidades
ideológica com o partido no poder, no Brasil, mantendo um silêncio cúmplice
ante a agressão imperialista brasileira contra o Haiti. Ato que deve ser
considerado uma violação evidente do primeiro capítulo da chamada doutrina do
mundo livre, ou seja, a autodeterminação dos povos. A ocupação do exército militar
brasileiro no Haiti é garantida por 1.200 homens e algumas dezenas de policiais
que, deliberadamente, fuzilam os pobres e estupram as mulheres haitianas com
apetite. Este comportamento é
digno de qualquer ocupante, portanto, o governo brasileiro não é progressista. Pelo contrário, é predador e faz o
trabalho sujo para o imperialismo.
Após a saída de
Jean-Claude Duvalier, em 1986, aqueles que contribuíram a perpetuação de seu
governo pelo terror e tortura tornaram-se problemáticos. O notório torturador Albert Pierre,
conhecido como "Ti boule", foi convidado a embarcar para o Brasil, um
Estado que, no entanto, não havia firmado qualquer tratado de extradição com o
Haiti. "Ti boule" ficou
ali, sem ninguém incomodá-lo, até sua pacífica morte, sem dar conta e responder
por seus crimes hediondos contra a nação haitiana. Portanto, há antecedentes não
resolvidos entre os dois Estados que merecem ser analisá-los a fim de revelar
se haveria qualquer ressentimento histórico do Estado brasileiro contra o
Haiti. Neste novo papel o Brasil
é moralmente qualificado para desempenhar o papel de polícia.
O Brasil é moralmente capaz de
estabilizar o Haiti?
Infelizmente, o
Brasil não se salvou, como foi o caso da Venezuela, do caudilhismo das décadas
de 1970 e 1980. Como o povo do
Haiti, o povo brasileiro conheceu a feroz ditadura militar, mas ao contrário de
nós, o ex-presidente Lula não aboliu o exército e nem mesmo o eliminou. E eis que, 25 anos mais tarde esta
mesma instituição repressiva impulsiona-se à cena internacional como o guardião
da democracia e da estabilidade. Eu
me pergunto, em nome de que moral se
atribuiu esta missão ao exército brasileiro, a não ser a da ironia.
Recordem que eu
havia mencionado a natureza repressiva do Brasil, "competição",
determinante para sua escolha como o novo amo do Haiti. Em um documento de 2005, a Anistia
Internacional observa que o Brasil contava com 52,2 homicidas por 100 mil
jovens, enquanto os Estados Unidos conta / contava com 32,2 homicídios por 100
mil jovens e Itália 2,1 homicidas por 100 mil jovens. Isso indica que este país está muito
mais enfermo do que o Haiti em matéria de segurança pública, no entanto, o
Brasil foi eleito chefe da missão de estabilização no Haiti.
Recentemente,
durante a visita do ministro de Justiça dos EUA ao Haiti, Eric Holder, este
afirmou que países como Jamaica, Porto Rico, República Dominicana são os mais
violentos na área, não Haiti!
A Anistia
Internacional continua: “O fato de ter a pele negra [no Brasil] é um fator de
risco adicional", a polícia brasileira é racista, o que explica plenamente
as intervenções assassinas das forças armadas brasileiras em bairros pobres [no
Haiti], como Cité Soleil, Bel-Air, etc. A
Anistia Internacional define da seguinte forma como garantir a segurança
pública no país: "Garantir a segurança pública é garantir que ninguém seja
morto, nem vítima de qualquer forma de violência”. As forças militares do governo brasileiro
têm em sua história muitos casos de massacres em seu próprio país. Assim, a 31 de março de 2005, "29
pessoas foram mortas na Baixada Fluminense [...] por homens armados
pertencentes à Polícia Militar [...] 08h30 – 11 horas, abriram fogo contra as
pessoas que passavam", de acordo Anistia Internacional.
Vamos citar alguns dos excessos cometidos pelos brasileiros
gendarmes:
1.
Massacre dos prisioneiros desarmados no complexo prisional do
Carandiru, em São Paulo, no ano de 1992.
2.
Em 1993, crianças de rua foram barbaramente assassinadas quando
dormiam nos degraus da catedral Candelária.
3.
Moradores da favela
do Vigário e os
ativistas dos direitos da terra em Eldorado dos Carajás foram mortos em 1997.
4. Só em 2003, a
polícia de São Paulo e do Rio de Janeiro mataram 2.110 pessoas, uma barbárie
qualificada de legítima defesa.
5. "No Brasil, o
número de homicídios é uma das mais altas do mundo" circulando no país 17
milhões de armas leves, dos quais 9 milhões não tem porte legal.
Portanto, os
duelos que semeiam as forças de ocupação no Haiti, fortemente dominado pelo
Brasil, fazem parte de uma série de práticas nacionais transferidas para dentro
da instituição dirigida por um comandante brasileiro. Com esta "licença para
matar", concedida aos ocupantes pelos governos haitianos dos últimos nove
anos, a imunidade outorgada aos cascos azuis corre o risco de afogar-se nos
emaranhados da impunidade: Lembremo-nos a negligência ultrajante das
responsabilidades da ONU na propagação do cólera, que causou milhares de mortes
no Haiti. E o pior é que o
organismo internacional se nega a pagar qualquer tipo de indenização às vítimas
desta terrível epidemia que continua contaminando os homens, mulheres e
crianças.
A Presidente Dilma Rousseff está ciente
de seu
papel de carrasco?
De
acordo com o analista haitiano Camille Chalmers, "Dos 20 membros do Estado
Maior da MINUSTAH, apenas dois são sul-americanos. Os demais são norte-americanos,
franceses, italianos e canadenses”, palavras citadas em Risal [Rede de Informação e Solidariedade com a América Latina]. Isso significa que, embora, aparentemente, o Brasil pareça o
dono da situação, quem detém o poder real é a aliança
estadunidense-franco-canadense. Deixaram
aos soldados sul-americanos o papel repressivo ao povo pobre. Tem-se a impressão que as ambições do
Brasil o deixam cego, o que pode levar a presidente deste país a cometer crimes
hediondos, como no caso do Haiti hoje. Lula
transferiu essa visão imperialista a sua sucessora, Dilma Rousseff, a atual
presidente do país, que, como seu tutor, mantém a humilhação acelerada do
Haiti.
A postura dos
patriotas do Haiti deve ser firme e inequívoca frente ao comportamento
agressivo das forças de ocupação, porque representamos o último reduto dos
autóctones. Sejam os americanos,
os canadenses franceses ou qualquer outro povo que cruze as fronteiras de outro
Estado, não tem outro objetivo senão a submissão do povo. Nosso dever de povo consciente
consiste em lutar até que todos saiam do Haiti.
Desta forma se acolheu com carinho e esperança a conferência de
31 de maio a 1 junho 2013, em
Port-au-Prince sobre a saída das forças da MINUSTAH
do país. Esta iniciativa muito
louvável, que tem como coordenador o senhor senador Moïse Jean-Charles, partiu
do Senado haitiano que exigiu por unanimidade a saída dos ocupantes do país até
o dia 28 de maio de 2014.
Devemos acrescentar, ainda, o desejo de nosso povo através da manifestação
popular diante do busto de Jean-Jacques Dessalines, fundador da nação haitiana,
no Champ-de-Mars, para exigir a retirada imediata das tropas estrangeiras do
país: Estes são os elementos que demonstram a ruptura do povo haitiano ante a
presença de colonos modernos nas ruas do Haiti.
O que o exército
ocupante está defendendo no Haiti são os interesses nacionais brasileiros e
estão dispostos a fazer qualquer coisa em defesa deles. Isso vale também para outros estados
presentes dentro da MINUSTAH.
Devemos enfatizar
que não há nenhuma força venezuelana ou cubana no Haiti, ou seja, Dilma
Rousseff (Brasil), Michelle Bachelet (Chile), Cristina Fernandez de Kirchner
(Argentina), Rafael Correa (Equador), Evo Morales (Bolívia) e de outros estados
poderiam ter rejeitado a oferta intervencionista. Portanto, se decidiram entrar
no Haiti, todos são ocupantes, todos contribuíram para humilhar o nosso povo,
nossa grandeza histórica e nossa cultura. Lula
optou por ceder às exigências americanas, canadenses e franceses, em vez das do
povo haitiano que sempre resistiu heroicamente à servidão.
Eles são
arrogantes como qualquer invasor. O
general extrovertido, que comandou as tropas da MINUSTAH está tão confortável
em seu dispositivo ocupante assassino que exigiu o retorno à forma das forças
armadas haitianas, que haviam sido legalmente dissolvidas. É um cálculo para medir o que foi
feito pelo governo brasileiro. O exército
do Haiti que foi transformado em partido político foi obra da ocupação de 19
anos dos EUA e seu papel de perpetuar a ocupação por muito tempo após a saída
dos Marines. O Brasil, que tem o
comando das tropas da Minustah, quer ter o controle substancial sobre o
conjunto das instituições nacionais pela intermediação de sua estrutura militar
deixada no país.
Em conclusão,
todos os países latino-americanos que fazem parte das forças de ocupação no
Haiti estão aqui, tão somente, para
defender seus interesses nacionais em detrimento da nossa dignidade como
povo, da nossa grandeza histórica e cultural.
O Brasil, país que
tem o comando das tropas, responde às suas ambições estratégicas, ainda que
internamente, vive uma situação mais dramática do que o Haiti.
O que quer dizer "ser revolucionário" para
Correa e Morales?
Nesta situação, deve-se
observar a hipocrisia demonstrada pelos governos do Equador e da Bolívia que se
gabam de ser revolucionários. O
presidente equatoriano Correa lutou bravamente para fechar a base militar dos
EUA em seu território. O número
um da Bolívia, Evo Morales, alcançou a fama do ponto de vista nacionalista, ao
expulsar a USAID e a Coca Cola de sua terra natal. No entanto, seus exércitos estão
envolvidos da degradação do Haiti, via a Minustah.
Quanta hipocrisia! Onde se situa a prática revolucionária
dos dois? Acaso, querem mudar o
léxico revolucionário convidando-nos a acreditar que os haitianos são animais
que não estão prontos para a democracia? Além
disso, mostram uma enorme falta de gratidão! Nossos
antepassados não ocuparam nenhuma parte dos países andinos, depois de ter
ajudado a conquistarem a sua independência. No
entanto, durante a cúpula pan-americana no Panamá esses mesmos andinos nos
haviam indexado, é claro, a pedido dos Estados Unidos! Hoje, estão reincidindo!
Progressistas
haitianos, toda ocupação conduz necessariamente à humilhação. Não há ocupantes bons, todos são maus
e assassinos. É essencial lutar
contra a ocupação do país até que saia o último soldado estrangeiro.
O povo do
Haiti converterá o dia 28 de maio de 2014, o Dia Nacional da desocupação do
território nacional!
Que viva o
Haiti! (Blog)
Joël LéonFuente: http://www.mondialisation.ca/haiti-premiere-victime-de-la-tentation-imperiale-du-bresil/5337637
Traduzido do francês por Beatriz Morales Bastos
Foto: Foto: Victoria Hazou - ONU / MINUSTAH
Traduzido para o português pelo blog: somostodospalestinos.blogspot.com
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