terça-feira, 2 de julho de 2013

Haiti, a primeira vítima da tentação imperialista do Brasil.

Comentário do Blog: O texto abaixo é mais que um desabafo de um haitiano, ele expressa o sentimento de todo o povo do Haiti com relação ao papel deplorável  de gendarme do imperialismo norteamericano e francês que o governo brasileiro cumpre a risca. Sem dúvida, o povo brasileiro, através de suas organizações sociais e partidos políticos  precisa tomar para si as dores desse povo irmão e fortalecer  a solidariedade com sua rebeldia histórica, com sua luta contra a ocupação do seu país pelo exército brasileiro , pela sua autodeterminação.
Os haitianos estão se organizando e deram um ultimato aos cascos azuis: FORA DO HAITI !



Antes da chegada ao Haiti da Missão de Estabilização das Nações Unidas (MINUSTAH, por sua sigla em Inglês), quando se falava do Brasil, a referencia era o futebol, o rei Pelé ou o Carnaval no Rio, que constitui uma maravilha artística e cultura. Isso é tão certo que, em sua busca para ganhar os corações e mentes dos haitianos, em 18 de agosto de 2004, o governo usou a seleção brasileira de futebol para jogar uma partida de futebol chamada "Pela Paz" contra a seleção do Haiti. Aquele dia foi um tormento para os jogadores haitianos que viram os nossos patriotas aplaudirem os jogadores brasileiros em detrimento de sua própria seleção. E, para castigar ainda mais o país, os jogadores e dirigentes brasileiros foram se hospedar no país vizinho, após o jogo, o que significava que o Haiti não era digno de honrar a hospitalidade às estrelas brasileiras. 

Não importa! Hoje, além de futebol e da cultura brasileira, há também os massacres de pessoas pobres, cólera e a arrogância natural de um exército ocupante na relação com os subjugados. Todavia, de uma perspectiva geopolítica e estratégica, a realidade brasileira é radicalmente diferente e está guiada pelo compromisso de estender sua influência sobre os demais países da região.

A maneira mais simples de definir o imperialismo é: "Aquele que procura estender sua autoridade sobre os outros", especialmente, aos pequenos. A presença militar no Haiti marca o Brasil entrando em uma fase imprudente em que é indispensável causar vítimas para proteger seu status de potência regional. O Brasil tem a hegemonia e o controle de 40% da economia sul-americana. Portanto, essa é uma transformação lógica. Tanto os impérios como os seus sistemas nasceram "entre o sangue e suor". A dominação não tem coração, ainda que alguns dominadores sejam mais ferozes do que outros, mas todos se baseiam na necessidade imperialista de submeter para o exercício da pilhagem das riquezas dos outros, a fim de beneficiar suas classes dominantes, sejam castas ou tribos. Neste contexto do século XXI, em que a complexidade do mundo ampliado torna mais difícil controlar o jogo das alianças, é mais trágico do que nunca. No mundo de muitas convulsões, com muitos incendios para apagar, muitos povos se insurgindo... Outros parceiros, certamente menos poderosos, mas capazes de dominar conflitos de baixa intensidade, são importantes para salvaguardar os interesses dos países mais poderosos. Assim se apresentou o Brasil.
Não é por acaso que os Estados Unidos e a França optaram pelo Brasil.  Conhecem as ambições imperialistas, de segundo amo do hemisfério, desde a esfera do econômico até sua obsessão declarada de ser parte do Conselho de Segurança da ONU e, também, reconhecem a larga experiência, adquirida nos anos da ditadura, com a repressão e assassinatos, um elemento essencial do cartão de visita internacional do Brasil. Sem negligenciar, no entanto, os interesses dos ricos deste país em expandir sua produção e cultivo para toda a região. Quando esses dois conquistadores solicitaram seus serviços, estavam certos de que o presidente Lula da Silva não resistiria a esta proposta. Para isso, sacrificou os vínculos e convicções ideológicas e preencheu o seu cartão de conquista. Assim, americanos canadenses e franceses chegaram ao país das favelas pela mão do "tutor aluno", afinal estão muito ocupados lidando com outras crises criadas no mundo.
A missão de Lula é "estabilizar" o Haiti. Em termos não diplomáticos, o Brasil deve desempenhar um papel de polícia. Os reveses  sofridos pelos EUA na Somália, em 1994 e 1995, e o impasse no Iraque e no Afeganistão e, mais recentemente, a invasão da  Líbia e a tentativa na Síria são algumas das frentes abertas onde o imperialismo está metido, o que o impede de se aventurar com  outro problema, cujo confronto os colocaria face a face com os negros do Haiti. Lula da Silva abusou dos laços culturais entre os dois países, Haiti e Brasil, para implementar a política de conquista.
Atenção, haitianos progressistas!

Alguns progressistas haitianos se deixam enganar pela lógica das proximidades ideológica com o partido no poder, no Brasil, mantendo um silêncio cúmplice ante a agressão imperialista brasileira contra o Haiti. Ato que deve ser considerado uma violação evidente do primeiro capítulo da chamada doutrina do mundo livre, ou seja, a autodeterminação dos povos. A ocupação do exército militar brasileiro no Haiti é garantida por 1.200 homens e algumas dezenas de policiais que, deliberadamente, fuzilam os pobres e estupram as mulheres haitianas com apetite. Este comportamento é digno de qualquer ocupante, portanto, o governo brasileiro não é progressista. Pelo contrário, é predador e faz o trabalho sujo para o  imperialismo.
Após a saída de Jean-Claude Duvalier, em 1986, aqueles que contribuíram a perpetuação de seu governo pelo terror e tortura tornaram-se problemáticos.  O notório torturador Albert Pierre, conhecido como "Ti boule", foi convidado a embarcar para o Brasil, um Estado que, no entanto, não havia firmado qualquer tratado de extradição com o Haiti. "Ti boule" ficou ali, sem ninguém incomodá-lo, até sua pacífica morte, sem dar conta e responder por seus crimes hediondos contra a nação haitiana. Portanto, há antecedentes não resolvidos entre os dois Estados que merecem ser analisá-los a fim de revelar se haveria qualquer ressentimento histórico do Estado brasileiro contra o Haiti. Neste novo papel o Brasil é moralmente qualificado para desempenhar o papel de polícia.
O Brasil é moralmente capaz de estabilizar o Haiti?

Infelizmente, o Brasil não se salvou, como foi o caso da Venezuela, do caudilhismo das décadas de 1970 e 1980. Como o povo do Haiti, o povo brasileiro conheceu a feroz ditadura militar, mas ao contrário de nós, o ex-presidente Lula não aboliu o exército e nem mesmo o eliminou. E eis que, 25 anos mais tarde esta mesma instituição repressiva impulsiona-se à cena internacional como o guardião da democracia e da estabilidade. Eu me pergunto,  em nome de que moral se atribuiu esta missão ao exército brasileiro, a não ser a da ironia.
Recordem que eu havia mencionado a natureza repressiva do Brasil, "competição", determinante para sua escolha como o novo amo do Haiti. Em um documento de 2005, a Anistia Internacional observa que o Brasil contava com 52,2 homicidas por 100 mil jovens, enquanto os Estados Unidos conta / contava com 32,2 homicídios por 100 mil jovens e Itália 2,1 homicidas por 100 mil jovens. Isso indica que este país está muito mais enfermo do que o Haiti em matéria de segurança pública, no entanto, o Brasil foi eleito chefe da missão de estabilização no Haiti.
Recentemente, durante a visita do ministro de Justiça dos EUA ao Haiti, Eric Holder, este afirmou que países como Jamaica, Porto Rico, República Dominicana são os mais violentos na área, não Haiti!
A Anistia Internacional continua: “O fato de ter a pele negra [no Brasil] é um fator de risco adicional", a polícia brasileira é racista, o que explica plenamente as intervenções assassinas das forças armadas brasileiras em bairros pobres [no Haiti], como Cité Soleil, Bel-Air, etc.  A Anistia Internacional define da seguinte forma como garantir a segurança pública no país: "Garantir a segurança pública é garantir que ninguém seja morto, nem vítima de qualquer forma de violência”.  As forças militares do governo brasileiro têm em sua história muitos casos de massacres em seu próprio país. Assim, a 31 de março de 2005, "29 pessoas foram mortas na Baixada Fluminense [...] por homens armados pertencentes à Polícia Militar [...] 08h30 – 11 horas, abriram fogo contra as pessoas que passavam", de acordo Anistia Internacional.
Vamos citar alguns dos excessos cometidos pelos brasileiros gendarmes:
1.      Massacre dos prisioneiros desarmados no complexo prisional do Carandiru, em São Paulo, no ano de 1992. 

2.      Em 1993, crianças de rua foram barbaramente assassinadas quando dormiam nos degraus da catedral Candelária. 

3.      Moradores da  favela do  Vigário e os ativistas dos direitos da terra em Eldorado dos Carajás foram mortos em 1997. 

4.      Só em 2003, a polícia de São Paulo e do Rio de Janeiro mataram 2.110 pessoas, uma barbárie qualificada de legítima defesa.

5.      "No Brasil, o número de homicídios é uma das mais altas do mundo" circulando no país 17 milhões de armas leves, dos quais 9 milhões não tem porte legal.


Portanto, os duelos que semeiam as forças de ocupação no Haiti, fortemente dominado pelo Brasil, fazem parte de uma série de práticas nacionais transferidas para dentro da instituição dirigida por um comandante brasileiro. Com esta "licença para matar", concedida aos ocupantes pelos governos haitianos dos últimos nove anos, a imunidade outorgada aos cascos azuis corre o risco de afogar-se nos emaranhados da impunidade: Lembremo-nos a negligência ultrajante das responsabilidades da ONU na propagação do cólera, que causou milhares de mortes no Haiti. E o pior é que o organismo internacional se nega a pagar qualquer tipo de indenização às vítimas desta terrível epidemia que continua contaminando os homens, mulheres e crianças.
A Presidente Dilma Rousseff está ciente de seu 
papel de carrasco?

De acordo com o analista haitiano Camille Chalmers, "Dos 20 membros do Estado Maior da MINUSTAH, apenas dois são sul-americanos.  Os demais são norte-americanos, franceses, italianos e canadenses”, palavras citadas em Risal [Rede de Informação e Solidariedade com a América Latina]. Isso significa que,  embora, aparentemente, o Brasil pareça o dono da situação, quem detém o poder real é a aliança estadunidense-franco-canadense. Deixaram aos soldados sul-americanos o papel repressivo ao povo pobre. Tem-se a impressão que as ambições do Brasil o deixam cego, o que pode levar a presidente deste país a cometer crimes hediondos, como no caso do Haiti hoje. Lula transferiu essa visão imperialista a sua sucessora, Dilma Rousseff, a atual presidente do país, que, como seu tutor, mantém a humilhação acelerada do Haiti.

A postura dos patriotas do Haiti deve ser firme e inequívoca frente ao comportamento agressivo das forças de ocupação, porque representamos o último reduto dos autóctones. Sejam os americanos, os canadenses franceses ou qualquer outro povo que cruze as fronteiras de outro Estado, não tem outro objetivo senão a submissão do povo. Nosso dever de povo consciente consiste em lutar até que todos saiam do Haiti.
Desta forma se acolheu com carinho e esperança a conferência de 31 de maio a 1  junho 2013, em Port-au-Prince sobre a saída das forças da MINUSTAH do país. Esta iniciativa muito louvável, que tem como coordenador o senhor senador Moïse Jean-Charles, partiu do Senado haitiano que exigiu por unanimidade a saída dos ocupantes do país até o dia 28 de maio de 2014.  Devemos acrescentar, ainda, o desejo de nosso povo através da manifestação popular diante do busto de Jean-Jacques Dessalines, fundador da nação haitiana, no Champ-de-Mars, para exigir a retirada imediata das tropas estrangeiras do país: Estes são os elementos que demonstram a ruptura do povo haitiano ante a presença de colonos modernos nas ruas do Haiti.


O que o exército ocupante está defendendo no Haiti são os interesses nacionais brasileiros e estão dispostos a fazer qualquer coisa em defesa deles. Isso vale também para outros estados presentes dentro da MINUSTAH.
Devemos enfatizar que não há nenhuma força venezuelana ou cubana no Haiti, ou seja, Dilma Rousseff (Brasil), Michelle Bachelet (Chile), Cristina Fernandez de Kirchner (Argentina), Rafael Correa (Equador), Evo Morales (Bolívia) e de outros estados poderiam ter rejeitado a oferta intervencionista. Portanto, se decidiram entrar no Haiti, todos são ocupantes, todos contribuíram para humilhar o nosso povo, nossa grandeza histórica e nossa cultura. Lula optou por ceder às exigências americanas, canadenses e franceses, em vez das do povo haitiano que sempre resistiu heroicamente à servidão.
Eles são arrogantes como qualquer invasor. O general extrovertido, que comandou as tropas da MINUSTAH está tão confortável em seu dispositivo ocupante assassino que exigiu o retorno à forma das forças armadas haitianas, que haviam sido legalmente dissolvidas. É um cálculo para medir o que foi feito pelo governo brasileiro. O exército do Haiti que foi transformado em partido político foi obra da ocupação de 19 anos dos EUA e seu papel de perpetuar a ocupação por muito tempo após a saída dos Marines. O Brasil, que tem o comando das tropas da Minustah, quer ter o controle substancial sobre o conjunto das instituições nacionais pela intermediação de sua estrutura militar deixada no país.
Em conclusão, todos os países latino-americanos que fazem parte das forças de ocupação no Haiti estão aqui, tão somente, para  defender seus interesses nacionais em detrimento da nossa dignidade como povo, da nossa grandeza histórica e cultural. 
O Brasil, país que tem o comando das tropas, responde às suas ambições estratégicas, ainda que internamente, vive uma situação mais dramática do que o Haiti. 
O que quer dizer "ser revolucionário" para  
Correa e Morales?
Nesta situação, deve-se observar a hipocrisia demonstrada pelos governos do Equador e da Bolívia que se gabam de ser revolucionários. O presidente equatoriano Correa lutou bravamente para fechar a base militar dos EUA em seu território. O número um da Bolívia, Evo Morales, alcançou a fama do ponto de vista nacionalista, ao expulsar a USAID e a Coca Cola de sua terra natal. No entanto, seus exércitos estão envolvidos da degradação do Haiti, via a Minustah. 
Quanta hipocrisia! Onde se situa a prática revolucionária dos dois? Acaso, querem mudar o léxico revolucionário convidando-nos a acreditar que os haitianos são animais que não estão prontos para a democracia? Além disso, mostram uma enorme falta de gratidão! Nossos antepassados ​​não ocuparam nenhuma parte dos países andinos, depois de ter ajudado a conquistarem a sua independência. No entanto, durante a cúpula pan-americana no Panamá esses mesmos andinos nos haviam indexado, é claro, a pedido dos Estados Unidos! Hoje, estão reincidindo!
Progressistas haitianos, toda ocupação conduz necessariamente à humilhação. Não há ocupantes bons, todos são maus e assassinos. É essencial lutar contra a ocupação do país até que saia o último soldado estrangeiro.
O povo do Haiti converterá o dia 28 de maio de 2014, o Dia Nacional da desocupação do território nacional!
Que viva o Haiti! (Blog)
Traduzido do francês por Beatriz Morales Bastos
Foto: Foto: Victoria Hazou -  ONU / MINUSTAH 
Traduzido para o português pelo blog: somostodospalestinos.blogspot.com

Nenhum comentário:

Postar um comentário