quinta-feira, 29 de março de 2012

Palestra do Embaixador Mohammed Khaddour sobre a situação na Síria no Seminário do Partido Comunista Brasileiro (PCB)



Rio de Janeiro – Brasil

24/03/2012 às 16:35 horas

Exmo. Sr. Ivan Pinheiro, Secretário Geral do Partido Comunista Brasileiro,
Senhoras e Senhores participantes,
Senhoras e Senhores,

Parabenizamos o Partido Comunista Brasileiro pelas comemorações dos 90 anos de sua fundação.

Gostaria de apresentar meus agradecimentos ao Partido Comunista Brasileiro, por me proporcionar esta oportunidade de falar a todos vocês neste seminário. Gostaria, ainda, de agradecer ao Partido Comunista Brasileiro por suas firmes posições de apoio ao direito dos povos justos, dentre os quais as causas do povo árabe. Agradeço ao partido pela sua posição positiva, diante da crise assistida pela Síria e por sua defesa da não interferência externa nos assuntos internos da Síria e pela defesa à sua soberania e independência.

A Síria tem assistido a acontecimentos dolorosos, planejados e financiados por regimes regionais e internacionais e executados por grupos terroristas armados, dentre os quais salafistas, outros ligados à Irmandade Muçulmana, outros ligados à Al Qaeda e os contrabandistas de armas.

Em primeiro lugar, porque a Síria está assistindo a estes acontecimentos?

Em segundo lugar, o que contribuiu para aumentar a gravidade dos acontecimentos e como isso ocorreu?

Em terceiro lugar, como o país enfrentou estes acontecimentos e como tratou as discrepâncias das posições árabes e internacionais diante destes acontecimentos?

Em quarto lugar, quais são os últimos desdobramentos do cenário sírio?

A Síria, que tem na sua capital Damasco a cidade habitada mais antiga do mundo, onde convivem habitantes das mais diferentes religiões, de onde surgiu o primeiro alfabeto no mundo e onde até hoje se fala a língua de Jesus Cristo, fato que prova que o cristianismo surgiu naquela região.

A Síria tem uma importante localização geopolítica na região e uma presença regional e internacional, da qual nunca abriu mão e para a qual sempre se manteve fiel. Isto fez com que ela se tornasse um alvo para aqueles que ambicionam o controle da região árabe e seus recursos.

Desde a década de 80, no século passado, a Síria tem sido alvo de sanções econômicas e pressões externas, que objetivaram obrigá-la a fazer parte de um plano ocidental para a região. Estas pressões ocorreram de diferentes modos, fato que prejudicou o seu processo de desenvolvimento social e econômico. Quando o povo sírio elegeu o Presidente Bashar Al Assad, no ano de 2000, este propôs um grande programa de reformas que atendesse às ambições do povo da Síria, mas os acontecimentos na região árabe e, mais especificamente nos países vizinhos à Síria, obstruíram o andamento deste programa de reformas. Dentre os acontecimentos que afetaram a Síria de forma direta, a ocupação americana do Iraque em 2003, o assassinato do Primeiro Ministro do Líbano, Rafik Al Hariri, em 2005, a ofensiva israelense contra o Líbano em 2006 e a ofensiva israelense contra os palestinos e o cerco a Gaza em 2008.

No terceiro mês de 2011, a Síria assistiu à alguns pleitos populares por reformas, que já faziam parte do programa original do Presidente Bashar Al Assad. Estes pleitos ocorreram em forma de protestos e o governo reconheceu sua legitimidade e atuou para atendê-los. Neste momento, os regimes da região e regimes internacionais aproveitaram a oportunidade para alimentar uma campanha midiática de incitações, através dos veículos de comunicação, árabes e estrangeiros, fornecer dinheiro e armas através de alguns países vizinhos que aceitaram para si o papel de fazer parte deste complô desenhado pelo ocidente para atingir a estabilidade e a segurança na Síria e, conseqüentemente, tentar dividi-la e desviá-la de suas posições, que atrapalhavam os projetos ocidentais para a região, para que abrisse mão de suas decisões independestes e sua soberania nacional.

No âmbito midiático, alguns veículos de imprensa árabes e internacionais foram encarregados de contribuir para estimular os manifestantes a realizarem atos de violência contra as forças de segurança e a hostilizar os cidadãos e as instituições públicas no país. Estes veículos de comunicação passaram a apresentar notícias e fotos fictícias, baseando-se no que chamou de correspondentes, testemunhas dentre os manifestantes e pessoas de fora da área das fronteiras sírias, passando uma dimensão exagerada dos acontecimentos e apresentando números, fotos e informações inverídicas que alguns países e organizações internacionais usaram como base para definir suas posições em relação à crise na Síria.

O Governo da Síria convidou os representantes destes veículos de comunicação internacional, presentes no país como correspondentes fixos, para que tratem a crise com objetividade, mas a maioria abandonou sua função jornalística a pedido do veículo ao qual pertencia e passou a transmitir notícias distantes da realidade. O Governo da Síria convidou, então, estes jornalistas e diplomatas árabes e estrangeiros presentes no país a visitarem um local na província de Idleb, perto da fronteira com a Turquia, chamado de Jisr Al Shoghor, para ver de perto uma carnificina cometida por homens armados contra as forças de segurança e o exército. Após verificarem a situação, nenhum destes jornalistas transmitiu o que viu aos seus respectivos veículos de comunicação e caso tenham transmitido, estes veículos não fizeram a divulgação. Alguns países passaram a exigir o envio de jornalistas à Síria, sob o pretexto de que o Governo da Síria não permitia a entrada destes, ao contrário da realidade. Eu afirmo que mais de 200 jornalistas entraram na Síria desde o início da crise, dentre os quais meios de comunicação brasileiros que escreveram para jornais brasileiros.

Com o aumento do número de jornalistas estrangeiros na Síria, aumentou também a incitação através dos diversos veículos de comunicação árabes e estrangeiros, que passaram a dar ênfase somente às incitações.

Alguns países da região e do ocidente, através do seu controle sobre as políticas decisórias de alguns organismos e instituições regionais e internacionais, adotaram posições em escala exagerada contra a Síria, que contribuíram para aumentar a violência internamente, além de adotarem medidas políticas e econômicas que prejudicaram a população síria, aprofundaram a crise humanitária, além de criar um clima de hostilidade dentro da oposição no exterior, convocando-a a não aceitar o diálogo sobre qualquer projeto nacional , exceto a bandeira para a derrubar o regime e criar um clima de desordem que levaria à uma intervenção externa, que poderia levar à guerra civil ou à divisão dos territórios de modo a enfraquecer o país. O que ouvimos e assistimos através dos meios de imprensa, foram apelos de instituições ocidentais que incitavam a oposição a não participar do diálogo, a não entregar as armas ao Estado e a não atender às resoluções de anistia anunciadas pelo Estado para absolver os envolvidos nos acontecimentos, além de convocar os países árabes e regionais a fornecer armas aos grupos armados do interior da Síria, fato que os incentivou e fez aumentar as ações terroristas. Foi a isso que assistimos na capital Damasco, na cidade de Aleppo e em outras cidades.

Então, a Liga dos Estados Árabes recorreu ao congelamento da participação dos comitês sírios em suas reuniões, para que não fosse permitido à Síria a apresentação dos fatos sobre os acontecimentos, adotou resoluções e medidas que prejudicaram a população síria e aprofundaram a crise, levou esta decisão ao Conselho de Segurança da ONU e exigiu a intervenção externa na Síria, ao invés de ajudar no diálogo e na solução da crise na Síria, através dos meios pacíficos.

As resoluções da Liga Árabe e de países da região transformaram-se em instrumento nas mãos do ocidente, com o claro objetivo de atingir a Síria. Convocaram para uma intervenção externa, através da criação de áreas de isolamento e de corredores humanitários e do envio de forças árabes e estrangeiras ao país.

O país atuou para enfrentar a crise no âmbito local, convocando para um diálogo nacional abrangente, com o objetivo de estudar a situação e as saídas para a crise, mas a oposição rejeitou a proposta a pedido do exterior, conforme mencionamos.

O Governo deu continuidade ao seu programa de reformas, que incluiu a lei dos partidos, a lei de imprensa, a lei eleitoral, a abolição do estado de emergência e por fim o anúncio da nova Constituição, que prevê novas reformas e o revezamento do poder no país. O Estado ainda atuou para proteger seus cidadãos e suas instituições públicas e privadas dos grupos terroristas armados e o povo sírio enfrentou a crise através de sua resistência, seu apoio às lideranças sírias no processo de reformas, que tomou forma nas várias passeatas de apoio, com as participação de milhares de pessoas, realizadas nas praças públicas da Síria e no exterior, realizadas pelos membros da comunidade síria.

No âmbito árabe, a Síria deu as boas vindas ao envio de observadores da Liga Árabe ao país, para que verificassem de perto os acontecimentos e quando estes testemunharam a existência dos grupos armados, que atuavam para abalar a estabilidade e a segurança do país, promover a matança e o seqüestro dos cidadãos e atacar os membros das forças de segurança, do exército e das instituições públicas, a Liga Árabe retirou seus observadores.

No âmbito internacional, a Síria colaborou amplamente com os aliados e países amigos para esclarecer a realidade dos acontecimentos e isso ajudou os países amigos, à exemplo da Rússia, da China, da Índia, do Brasil, da África do Sul e outros países a se posicionarem frente à projetos de resoluções internacionais que objetivavam abalar a segurança e a estabilidade da Síria e, conseqüentemente da região. Estes países amigos buscaram projetos de soluções através do diálogo político e sem a intervenção externa.

A Síria deu as boas vindas ao emissário das Nações Unidas Kofi Anan e à comitiva técnica que o acompanhou.

A Síria deus as boas vindas à visita de Valerie Ámos e à comitiva técnica ligada ao organismo humanitário internacional, quando foi acordado o envio das ajudas humanitárias, em colaboração com o governo da Síria, aos locais onde a crise se aprofundou em conseqüência do cerco imposto ao país, agravada pela incapacidade do Estado, por um certo período, de levar as ajudas aos cidadãos devido ao controle dos grupos armados sobre estas áreas, em sua maioria habitações localizadas em áreas remotas.

A Síria deu as boas vindas à iniciativa chinesa para a solução da crise, através da busca de uma solução pacífica, da não intervenção externa e do diálogo nacional.

A Síria fez fracassar o plano inimigo através da resistência, da vontade de seu povo, do comprometimento deste povo com sua unidade nacional e do seu apoio às reformas adotadas pelo governo. Pedimos à comunidade internacional que ponha um fim ao apoio aos atos de terrorismo cometidos pelos grupos armados, que recebem apoio de partes regionais e internacionais, desafiando desta forma as resoluções do Conselho de Segurança sobre o combate ao terrorismo internacional, à Lei Internacional e à Lei Humanitária Internacional.

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