O Partido Comunista dos Trabalhadores da Tunísia (PCTT) atuou durante 25 anos na mais estrita clandestinidade, perseguido pelo regime do ditador Ben Ali, derrubado na Revolução de 14 de janeiro. Uma conquista do movimento foi o restabelecimento das liberdades políticas e com estas a legalização dos partidos revolucionários. Na ocasião em que foi legalizado, na semana passada, o PCTT lançou um documento em que também faz uma análise do processo em curso no país do Magreb. Acompanhe a íntegra
A marcha deve continuar até que a revolução alcance seus objetivos
Depois de ter militado durante 25 anos na clandestinidade, o Partido Comunista dos Trabalhadores da Tunísia acaba de ser legalizado. É uma vitória não somente dos seus militantes, mas também do conjunto dos trabalhadores e do povo tunisiano.
Este acontecimento tem um importante significado simbólico, é fruto, entre outros, da revolução de 14 de janeiro que derrotou Ben Ali, impôs o direito de organização e inaugurou uma nova era para a Tunísia e seu povo.
O PCTT foi criado em 3 de janeiro d 1986, dia do segundo aniversário da gloriosa insurreição do pão, uma forma de mostrar nossa determinação de ligar nosso destino ao do povo tunisiano, a defender seus interesses e suas aspirações legítimas a uma vida digna, onde reinem a liberdade, a democracia e a justiça social. O PCTT traduziu seus compromissos em seu programa político e suas práticas militantes, sob a palavra de ordem da “revolução democrática nacional e popular”, ele continuou a defendê-lo, ao preço de enormes sacrifícios: Nabil Barakati morreu como mártir, centenas de nossos militantes foram torturados, presos e privados de seus direitos mais elementares, muitos deles conheceram o exílio.
Nosso partido acompanhou nosso povo durante um quarto de século, fazendo da derrubada da ditadura um objetivo primordial, considerando que ela constitui um obstáculo maior à emancipação do povo e ao renascimento da pátria. O partido tinha total confiança em nosso povo, lutou contra o pensamento reacionário que o subestimava, o acusava de impotência e resignação. Ele trabalhou continuamente para elevar sua consciência e organizá-lo de acordo com o que permitia a ação clandestina e a ausência de liberdades. Ele esteve em todas as suas lutas e contribuiu para unir a oposição para garantir a vitória contra a ditadura.
A revolução de 14 de janeiro é o coroamento de mais de 20 anos de luta e sacrifícios do povo tunisiano, de seus filhos com suas diferentes tendências ideológicas e políticas, opostas à ditadura, organizados nos partidos, associações e organizações sindicais e de defesa dos direitos humanos ou não organizados.
Esta revolução tomou muitas dimensões, é uma revolução política contra a tirania e a subjugação, uma revolução social contra a exploração e a corrupção, uma revolução patriótica pela dignidade. A revolução não parou na Tunísia, ela se estendeu a outros países árabes, onde os povos se levantam contra regimes tirânicos e corruptos e os fazem cair uns após outros.
A revolução de 14 de janeiro ainda não terminou, pois não atingiu todos os seus objetivos, malgrado o caminho percorrido. As forças reacionárias a espreitam e tentam fazê-la abortar, apoiadas nisso pelos Estados Unidos e a França, querem reduzi-la a uma simples reforma do antigo regime, sem entretanto atingir seus fundamentos e suas bases econômicas e sociais. A questão fundamental em toda revolução é o poder, e enquanto os sujeitos que fizeram a revolução não detenham o poder, não se pode concluir que conquistou seus objetivos e venceu. É o que ocorre na Tunísia, onde o povo se levantou mas ainda não obteve o poder.
Na primeira fase da revolução, o povo derrubou o ditador. Na segunda fase que concerne a vitória contra a ditadura, o povo conseguiu, graças a sua vigilância e determinação, derrubar o governo de Ganouchi e impor a reivindicação de convocar uma assembléia constituinte, assim como a dissolução do RCD e da polícia política. Igualmente, o povo alargou o campo das liberdades de expressão e de organização de maneira considerável.
Mas, o poder permanece nas mãos das forças reacionárias, implantadas em diferentes aparatos e instituições, seus interesses econômicos continuam preservados. Essas forças cometem crimes contra o povo (agressões, saques, tumultos...). Elas tentam fissurar sua união atiçando as visões tribais regionalistas e religiosas; elas tendem a dissuadi-las de seguir a revolução e a realização de seus objetivos semeando o medo e o terror.
A presidência interina e o governo provisório se empenham em sabotar a legitimidade revolucionária e rejeitam todo controle de suas decisões no interesse dos inimigos da revolução (nomeação de delegados, responsáveis pela segurança, pessoal do judiciário...). Eles se recusaram a tratar com o “conselho nacional de proteção da revolução” que eles substituíram por uma “instância” cujos membros designaram de maneira unilateral, assim como a decisão de dissolver o RCD (partido de sustentação da ditadura de Bem Ali) pode desaparecer através do retorno desse partido sob novas formas, sendo também este o caso no que se refere à decisão de dissolver a polícia política que está cercada de dúvidas e levanta sérias interrogações sobre sua aplicação.
As massas populares, particularmente no interior do país, começam a ter o sentimento de que nada mudou em sua vida política e em suas condições sociais, que sua revolução está prestes a ser roubada. É um sentimento legítimo por razões compreensíveis. O antigo regime permanece no lugar, com seu aparato e sua administração. O governo provisório não tomou nenhuma medida urgente para atenuar o peso do desemprego, da carestia de vida, da degradação do serviço público que golpeiam as regiões que mais sofreram a repressão e a pilhagem antes e durante o desencadeamento da revolução. É o caso da bacia mineral de Skhira, Benguerdane e muitas outras regiões.
O Partido Comunista dos Trabalhadores da Tunísia considera que a revolução não terminou, o povo tunisiano deve continuar vigilante para afastar os perigos que a ameaçam. O prosseguimento da mobilização, a conservação e a dinamização do “conselho nacional de proteção da revolução” e de seus comitês locais são missões urgentes hoje.
Neste momento, o povo continua sendo o único capaz de exercer um controle sobre a presidência interina e o governo provisório, ele tem o direito de supervisionar e exigir prestação de contas.
A eleição da “assembléia constituinte” é uma agenda importante no período futuro, os trabalhadores, as camadas laboriosas e o conjunto de nosso povo podem, em ligação com o PCTT e o conjunto das forças democráticas e revolucionárias, torná-la um momento decisivo para impor a vontade do povo e deter os inimigos da revolução.
Isto não se pode realizar sem uma mobilização imediata para prorrogar a data das eleições, a fim de permitir que o povo e as forças políticas se preparem bem, considerando a importância das questões que a assembléia constituinte vai selar.
Igualmente, é necessário preparar o terreno político propício para o saneamento da administração, da justiça, dos meios de comunicação, pela dissolução efetiva da polícia política e a instauração de uma lei eleitoral que leve em conta a questão do financiamento dos partidos, para garantir a transparência e a igualdade entre todos os participantes e evitar que essas eleições sejam marcadas pela corrupção.
A natureza do período transitório não impede em absoluto a necessidade de tomar medidas econômicas e sociais urgentes, sobretudo em favor dos desempregados, das regiões abandonadas, apesar das suas riquezas e do seu potencial.
O governo de transição continua preso ao orçamento decidido sob o governo de Ben Ali, no qual uma parte importante está destinada ao ministério do interior e para o pagamento da dívida contraída pela ditadura. Por que o governo não procede à anulação da dívida ou pelo menos à sua suspensão, como foi o caso nos países que viveram o mesmo esquema que a Tunísia? Por que não consagrar todo o seu montante para melhorar a vida cotidiana do povo? Por que o orçamento não é revisado em função das novas prioridades?
A revolução tunisiana se estendeu a numerosos países árabes. O ditador do Egito foi derrubado, enquanto que no Iêmen e no Bahrein os levantamentos populares são reprimidos de maneira atroz pelos regimes autoritários com a ajuda da Arábia Saudita. Ao lado de nós, o povo líbio se levantou contra seus torturadores, mas as coisas tomaram um grave caminho com a intervenção dos Estados Unidos e seus aliados, sob a cobertura de proteção aos civis. A administração americana não evocou nem um pouco o assassinato de civis no Iêmen e no Bahrein, como jamais fez com Gaza, o Líbano ou Iraque e Afeganistão que ela ocupa. Quanto a Sarkozy ele não apoiou o ditador tunisiano até o último momento?
O que leva Obama, Sarkozy e Cameron a intervir é a corrida desenfreada para compartilhar o petróleo líbio, depois do aborto de sua revolução. Nós respaldamos o povo líbio no seu levantamento, mas somos contra toda intervenção estrangeira que não somente atingirá a revolução na Líbia mas também na Tunísia e em todos os países árabes. Nós nos opomos à utilização de nosso território ou de nosso espaço aéreo na agressão contra a Líbia. Os colonialistas americanos, franceses e ingleses não têm nenhum interesse no triunfo das revoluções árabes devido ao perigo que isto representa para eles.
Viva a revolução do povo tunisiano!
Que a revolução continue até atingir seus objetivos!
Que o poder seja do povo!
Vivam os levantamentos dos povos árabes pela liberdade e a dignidade!
O Partido Comunista dos Trabalhadores da Tunísia
Tunis, 23 de março de 2011
Traduzido por José Reinaldo Carvalho, editor do Vermelho
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