Jorge Cadima - 03.02.09
A barbárie em Gaza foi impossível de esconder, mesmo nos cada vez mais controlados meios de propaganda do imperialismo: mais de 1.300 mortos (quase um em cada mil habitantes), na sua grande maioria civis aprisionados no gigantesco campo de concentramento em que Israel e a pseudo-«comunidade internacional» transformou Gaza; bombardeamentos com fósforo branco e outras armas não convencionais em áreas densamente habitadas; ataques a centros de refugiados da ONU e a pessoal médico em serviço; o bombardeamento dos centros de recolha de ajuda da ONU (com fósforo branco); o ataque a um edifício onde as próprias tropas israelitas tinham juntado 110 civis, provocando a morte a 30; o ataque a civis em fuga das zonas bombardeadas.
Enquanto a União Europeia encobria as mentiras do governo israelita, outros não calaram a sua consciência. No Parlamento britânico, o ex-membro de governos trabalhistas Gerald Kaufman, judeu e de uma família sionista, afirmou: «Olmert, Livni e Barak são assassinos em massa, criminosos de guerra, e envergonham o povo judaico, cuja Estrela de David utilizam como bandeira em Gaza» (o discurso pode ser visto no Youtube). Há quem tenha usado a expressão «holocausto» para descrever a matança de Gaza. O primeiro a usá-la foi o vice-ministro israelita da "Defesa", Matan Vilnai, que em Fevereiro passado ameaçou: «Quanto mais o fogo dos Qassam se intensificar, e o seu alcance se alongar, maior será a shoah que irão trazer sobre si» (Guardian, 29.2.08).
Muito se falou em Hamas e em «rockets Qassam». Confundem-se as causas com os efeitos. As mesmas palavras e acusações lançadas hoje sobre o Hamas foram lançadas ontem sobre o Presidente Arafat e a OLP. O comunicado oficial do governo israelita de 11 de Setembro de 2003 afirma: «Os acontecimentos destes dias reiteraram e comprovaram que Yasser Arafat é um obstáculo total a qualquer processo de reconciliação entre Israel e os Palestinos. Israel irá trabalhar para remover este obstáculo, da forma e no momento da sua escolha». Para que não sobrassem dúvidas sobre o significado destas palavras, o então vice-chefe do governo, e actual primeiro ministro, Ehud Olmert afirmou que assassinar Arafat era «seguramente uma das opções» (The Independent, 15.9.03). Catorze meses mais tarde, Arafat estava morto. O hospital militar francês onde morreu nunca indicou as causas da sua morte.
A chacina de Gaza condensou em três semanas muitas décadas de História. Uma história infindável de massacres e de guerras, que vai de Deir Yassin a Gaza, passando por Sabra, Shatila ou Qana, e que se traduz na gradual ocupação de cada vez mais território palestino e na permanente influência imperialista na região. A maioria dos habitantes de Gaza são refugiados de anteriores guerras de ocupação. «Na tarde fria de quarta-feira, dia 10 de Março de 1948, um grupo de onze homens, veteranos dirigentes sionistas e jovens oficiais militares judaicos, puseram os retoques finais no plano de limpeza étnica da Palestina. [...] Uma vez tomada a decisão, foram precisos seis meses para completar a missão. No final, mais de metade da população nativa da Palestina, cerca de 800.000 pessoas, tinham sido desenraizadas, 531 aldeias tinham sido destruídas e onze bairros urbanos esvaziados dos seus habitantes». O autor destas palavras é o historiador (judeu e israelense) Ilan Pappe, no livro «A limpeza étnica da Palestina» (Oneworld Publications, 2006).
O Estado sionista, «tentáculo nuclear dos EUA» no Médio Oriente, nas recentes palavras do Presidente da Assembleia Geral da ONU, sempre foi uma das principais ameaças à paz mundial. O povo palestino é a sua maior (mas não única) vítima. Sem justiça para o povo palestino haverá sempre resistência. E a resistência deste povo (heróica, dada a desproporção de meios) é seguramente um motivo de esperança e confiança. A violência militar imperialista não é capaz de vencer a determinação de um povo. Este texto foi publicado no Avante nº 1.835 de 29 de Janeiro de 2009
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