Israel foi
estabelecido sobre uma premissa problemática de ser uma pátria de todos os
judeus, em todos os lugares – não dos próprios habitantes nativos da Palestina
– e sobre uma fundação sangrenta, a da Nakba1 e a destruição da
Palestina histórica e a expulsão de seu povo.
Independentemente do resultado das últimas
eleições israelitas, os partidos árabes não colherão benefícios políticos
significativos, mesmo que alcancem coletivamente a sua maior representação de
todos os tempos. A razão não se prende com os partidos em si, mas com o sistema
político enviesado de Israel que se baseia no racismo e na marginalização dos
não-judeus.
Israel foi estabelecido sobre uma premissa problemática de ser
uma pátria de todos os judeus, em todos os lugares – não dos próprios
habitantes nativos da Palestina – e sobre uma fundação sangrenta, a da Nakba1 e
a destruição da Palestina histórica e a expulsão de seu povo.
Tais começos dificilmente conduziram ao estabelecimento de uma
verdadeira democracia, perfeita ou defeituosa. A atitude discriminatória de
Israel não apenas persistiu ao longo dos anos mas, na verdade, piorou,
especialmente porque a população árabe palestina aumentou desproporcionalmente
em comparação com a população judaica entre o rio Jordão e o mar Mediterrâneo.
A infeliz realidade é que alguns partidos árabes têm participado
nas eleições israelitas desde 1949, alguns de forma independente e outros sob o
chapéu de chuva do partido dominante, Mapei2. Fizeram-no apesar
das comunidades árabes em Israel terem sido administradas por um governo
militar (1951-1966) e praticamente governadas, até hoje, pelo ilegal 'Defesa
(Regulamentos de Emergência)'. Essa participação tem sido constantemente
elogiada por Israel e seus apoiantes como prova da natureza democrática do
Estado.
Esta afirmação por si só tem servido como a espinha dorsal
da hasbara3 israelita
ao longo das décadas. Embora, muitas vezes involuntariamente, os partidos
políticos árabes em Israel tenham fornecido o material para tal propaganda,
tornando difícil para os palestinos argumentar que o sistema político israelita
é fundamentalmente deformado e racista.
Os cidadãos palestinos sempre debateram entre si os prós e os
contras de participar nas eleições israelitas. Alguns entenderam que a sua
participação valida a ideologia sionista e o apartheid israelita, enquanto outros
argumentaram que abster-se de participar do processo político nega aos palestinos
a oportunidade de mudar o sistema por dentro.
O último argumento perdeu muito do seu mérito à medida que
Israel se afundava cada vez mais no apartheid,
enquanto as condições sociais, políticas e legais dos palestinos pioravam.
O Centro Jurídico para os Direitos das Minorias
Árabes em Israel (Adalah) relata dezenas de leis discriminatórias em Israel que
visam exclusivamente as comunidades árabes. Além disso, num relatório publicado
em fevereiro, a Amnistia Internacional descreve minuciosamente como a
“representação dos cidadãos palestinos de Israel no processo de tomada de
decisão… foi restringido e prejudicado por uma série de leis e políticas
israelitas”.
Essa realidade existe há décadas, muito antes de 19 de julho de
2018, quando o parlamento israelita aprovou a chamada Lei Base do Estado-Nação
Judaico. A Lei foi o exemplo mais flagrante de racismo político e legal, que
fez de Israel um regime de apartheid de
pleno direito.
A Lei também foi a proclamação mais articulada da supremacia
judaica sobre os palestinos em todos os aspetos da vida, incluindo o direito à
autodeterminação.
Aqueles que argumentaram que a participação árabe na política
israelita serviu um propósito no passado deveriam ter feito mais do que
denunciar coletivamente a lei do Estado-nação, demitindo-se em massa, com
efeito imediato. Eles deveriam ter aproveitado o alvoroço internacional para
converter a sua luta de parlamentar em popular.
Infelizmente, eles não o fizeram. Continuaram a participar nas
eleições israelitas, argumentando que, se conseguissem maior representação no
Knesset israelita, deveriam ser capazes de desafiar o tsunami das leis
discriminatórias israelitas.
Isso não aconteceu, mesmo depois de a Lista Conjunta, que
unificou quatro partidos árabes nas eleições de março de 2020, ter alcançado a
sua maior participação de sempre, tornando-se o terceiro maior bloco político
do Knesset.
A suposta vitória histórica culminou em nada porque todos os
principais partidos judeus, independentemente das suas origens ideológicas, se
recusaram a incluir os partidos árabes nas suas coligações potenciais.
O entusiasmo que mobilizou os eleitores árabes em torno da Lista
Conjunta começou a diminuir, e a própria Lista se fragmentou, graças a Mansour
Abbas, chefe do partido árabe Ra'am.
Nas eleições de março de 2021, Abbas queria mudar completamente
a dinâmica da política árabe em Israel. “Focamo-nos nas questões e problemas
dos cidadãos árabes de Israel dentro da Linha Verde”, disse Abbas à revista
TIME em junho de 2021, acrescentando que “queremos sanar os nossos próprios
problemas”, como se declarasse uma desvinculação histórica do resto da luta
palestiniana.
Abbas estava errado, pois Israel percebe que ele, os seus
seguidores, a Lista Conjunta e todos os palestinos são obstáculos nos seus
esforços para manter a exclusivista 'identidade judaica' do Estado. A
experiência de Abbas, no entanto, tornou-se ainda mais interessante, quando o
Ra'am ganhou 4 assentos e se juntou a uma coligação governamental liderada pelo
político de extrema-direita e anti palestino Naftali Bennet.
Quando a coligação entrou em colapso, em junho, Abbas conseguiu
pouco, além de dividir o voto árabe e provar, novamente, que mudar a política
israelita por dentro sempre foi uma fantasia.
Mesmo depois de tudo isso, os partidos árabes em Israel ainda
insistiam em participar num sistema político que, apesar das suas inúmeras
contradições, concordava numa coisa: os palestinos
são, e sempre serão, o inimigo.
Mesmo os violentos acontecimentos de maio de 2021, onde os palestinos
se viram a lutar em várias frentes – contra o exército israelita, a polícia, os
serviços de inteligência, os colonos armados e até mesmo cidadãos comuns – não
pareceram mudar a mentalidade dos políticos árabes.
Centros populacionais árabes em Umm Al-Fahm,
Lydda e Jaffa foram atacados com a mesma mentalidade racista que o fazem em
Gaza e Sheikh Jarrah, ilustrando que quase 75 anos de suposta integração entre
judeus e árabes sob o sistema político de Israel dificilmente mudaram a visão
racista em relação aos palestinos.
Em vez de converter a energia do que os palestinos chamam de
'Unidade Intifada' para investir na unidade palestina, os políticos israelitas
árabes retornaram ao Knesset israelita, como se ainda tivessem esperança de
salvar o sistema político inerentemente corrupto e racista de Israel.
A auto ilusão continua. Em 29 de setembro, o Comitê Eleitoral
Central de Israel impediu um partido árabe, Balad, de concorrer às
eleições de novembro. A decisão acabou por ser anulada pelo Supremo Tribunal do
país, levando uma organização jurídica árabe em Israel a descrever a decisão
como 'histórica'!? Em essência, sugeriram que o sistema de apartheid de Israel ainda
alimenta a esperança de uma verdadeira democracia.
O futuro da política árabe em Israel permanecerá sombrio se os
políticos árabes continuarem a perseguir essa tática fracassada. Embora os
cidadãos palestinos de Israel sejam socioeconomicamente privilegiados se
comparados com os palestinos nos Territórios Ocupados, eles desfrutam de
direitos políticos ou legais nominais ou inexistentes.
Ao permanecerem participantes leais na farsa da
democracia de Israel, esses políticos continuam a validar o regime israelita,
prejudicando, assim, não apenas as comunidades palestinianas em Israel, mas, de
fato, os palestinos em toda a parte.
1A Nakba,
o "desastre", "catástrofe" ou "cataclismo",
também conhecida como a Catástrofe Palestina, foi a destruição da sociedade
palestina e da pátria em 1948, e a deslocação permanente da maioria dos árabes palestinos.
O termo também é usado para descrever a contínua perseguição, deslocação e
ocupação dos palestinos, tanto na Cisjordânia ocupada como na Faixa de Gaza,
bem como nos campos de refugiados palestinos em toda a região. https://en.wikipedia.org/wiki/Nakba#:~:text=The%20Nakba%20(Arabic%3A%20%D8%A7%D9%84%D9%86%D9%83%D8%A8%D8%A9%2C,majority%20of%20the%20Palestinian%20Arabs (NT)
2 O Partido de los Trabalhadores da
Terra de Israel, mais conhecido pelas suas siglas Mapei, foi um partido
político de Israel, de centro- esquerda, de ideologia socialdemocrata que
foi a força política predominante no país até que, em 1968 se fundiu com
outros partidos para formar o Partido Trabalhista Israelita (NT) https://es.wikipedia.org/wiki/Mapai_(partido_pol%C3%ADtico)
3 Hasbará designa
o esforço israelita de relações públicas para difundir, no exterior,
informações positivas ou propaganda do Estado de Israel e as suas ações. O
termo é usado pelo governo israelita e seus apoiantes para descrever
iniciativas que consistem em explicar as políticas governamentais e promover Israel,
contrapondo-se à mídia desfavorável e ao que consideram como uma campanha de
deslegitimização de Israel no mundo. Hasbara significa
"explicação" e é também um eufemismo para simples propaganda.
(NT) https://pt.wikipedia.org/wiki/Hasbar%C3%A1
Fonte: Chasing a Mirage: How Israel's Arab Politcal Parties
Validate Apartheid (mintpressnews.com), publicado e acedido em
07.11.2022
Tradução: TAM
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