domingo, 9 de junho de 2013

O que as mídias corporativas não contam acerca da explosão social na Turquia

por LibreRed [*]

O novo sultão, cartoon de Latuff.





















Um dos argumentos mais utilizados pelos grandes media de comunicação ocidentais quando se trata de interpretar a origem da explosão social nas ruas da Turquia é a deriva islâmica e autoritária do governo de Recep Tayip Erdogan.

Deste modo, os mass media centram toda a atenção na disjuntiva islamismo-laicismo e autoritarismo-democracia, fazendo uma análise simplista e parcial da realidade que vive estes dias o país euro-asiático.

Mas para analisar com maior profundidade a recente revolta popular nas ruas de cidades como Istambul ou Ancara seria preciso adoptar outra perspectiva e por a lupa nas políticas sócio-económicas que o executivo tem desenvolvido nestes últimos anos.

O governo de Erdogan, integrado pelo Partido Justiça e Desenvolvimento (AKP), chega ao poder no ano de 2002 num contexto de crise económica (crise financeira de 2001) onde acorda um programa de medidas de feitio claramente neoliberal com o Fundo Monetário Internacional (FMI) que passam pela privatização do sector público, reformas laborais e drásticos cortes sociais.

Um ano depois de chegar ao governo, em 2003, é aberto o caminho à privatização da empresa pública de telecomunicações Turk Telekom [1] . No ano seguinte, 2004, põem-se à venda companhias de bebida, fábricas de aço e a as Linhas Aéreas Turcas [2] .

Desde então, inicia-se um processo que não tem marcha-atrás. Em 2007, dá-se sinal verde à privatização da empresa pública de tabacos da Turquia, Tekel [3] . Em 2008, é a vez da rede eléctrica, com a venda de duas companhias de distribuição em Ancara e Sakarya-Kocaeli [4] . Além disso, nesse mesmo ano anuncia-se a venda de banco de propriedade estatal Halkbank e a privatização de 15 por cento das acções da Turk Telekom.

Em 2009, o governo aprova legislação para conceder a água dos rios, dos lagos e das albufeiras às corporações privadas. Isto significa que os recursos hídricos podem ser transferidos a corporações, que até então controlavam só os serviços de distribuição [5] .

Diante disto, a Confederação dos sindicatos camponeses turcos, Çiftçi-Sen, juntamente com mais de 100 outras forças de oposição social que defendem o reconhecimento do direito à água, constituem uma plataforma chamada "Não à comercialização da água" e manifestam-se maciçamente em 15 de Março de 2009 em Istambul no âmbito do Fórum Mundial da Água [6] .

Em 2011, o governo de Erdogan inicia as negociações para a privatização [7] de 2.000 quilómetros de auto-estradas e pontes do país. Desta maneira o executivo turco pretende ceder ao capital privado até nove rodovias com portagem e duas pontes sobre o Bósforo, vias de comunicação muito importantes na área de Istambul.

Através da chamada "Administração de Privatizações" (OIB na sua sigla em turco), Erdogan procurar fazer avançar um pacote de privatizações no país que inclui o têxtil, a mineração, o petróleo, a alimentação e o transporte marítimo, dentre outros sectores [8] .

Em Fevereiro desse mesmo ano, 10 mil pessoas manifestam-se no centro de Ancara em repúdio à reforma laboral do governo que, entre outras medidas, inclui a redução do salário mínimo para os jovens, a possibilidade de transferência dos funcionários e permite a contratação de empregados sem seguro social [9] .

Muitos dos presentes à manifestação gritam em coro: "Isto é Ancara, não o Cairo", "Tayyip, chegou a sua vez" e "Tayyip, te desejamos um final [tão] feliz como o de Mubarak".

As directrizes neoliberais aplicadas durante estes últimos anos geraram um aumento da desigualdade social no país. Segundo a revista Forbes, em Istambul, capital financeira da Turquia, havia um total de 35 multi-milionários em Março de 2008 (em comparação com 25 em 2007), situando-se em 4º lugar no mundo. Um relatório para empresários interessados em investir na Turquia elaborado pelo banco espanhol Banesto assegura que "o país está marcado pela existência de fortes desigualdades de rendimento" [10] . Muitos empregados na Turquia não ganham mais que o salário mínimo de 570 dólares e o rendimento per capita é quase a metade dos rendimentos médios europeus.

Talvez este conjunto de factores ajude a explicar o mal-estar social que deu origem aos distúrbios hoje vividos na Turquia, para além do enfoque liberal que a imprensa do Ocidente pretende dar dos mesmos.
Referências: 
[1] elpais.com/diario/2003/11/12/economia/1068591610_850215.html
[2] spanish.peopledaily.com.cn/spanish/200402/12/sp20040212_72471.html
[3] www.icex.es/...
[4] www.hispanatolia.com/...
[5] www.tni.org/
[6] www.eurovia.org/spip.php?article67&lang=fr
[7] www.cincodias.com/... as/turquia-inicia-privatizacion-2000-kilometros-autopistas/20110830cdscdiemp_16/
[8] www.oib.gov.tr/index_eng.htm
[9] http://www.abc.es/agencias/noticia.asp?noticia=677519
[10] comercioexterior.banesto.es/... 


Ver também: 

  • La policía turca ataca sedes del Partido Comunista
  • Masivas marchas en distintas ciudades turcas exigen la dimisión del Gobierno
  • http://occupygezipics.tumblr.com/
  • Esbozos sobre la Condición de la Clase Obrera en Turquía

  • Líder da oposição clama por eleiçõs antecipadas 
    O original encontra-se em http://www.librered.net/?p=27218 


    Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .
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